sábado, 21 de novembro de 2009

Cadê a praia?

Faz pouco tempo que voltei de uma tour de quatro viagens, relativamente longas, por dois países diferentes. O segundo semestre foi insano. Se eu tinha clareza que necessitava respirar outros ares, agora tenho certeza que outros ares pesam nos pulmões. Estou exausta. E só de olhar pra mala entre-aberta na sala, 23kg de roupa suja e mais um monte de quinquilharias novas para arrumar, já me bate uma moleza, um enfado indizível. O mais importante é que estas viagens são a realização de um projeto gestado por quase um ano. Eu queria viajar, praticar a alteridade, conhecer novas culinárias, novas caras, novos estilos de vida. Tudo isso é medo de me tornar aqueles leigos chatos que repetem jargões de antropologia de mesa de bar " viajar é conhecer novas culturas". O senso comum me envergonha. Depois de mochilar com elegância pela Argentina e pelo Uruguai, decidi rearrumar as malas e encarar o sul de Minas. E essa coragem toda me fez acreditar que deveria relatar essa empreitada. Não sei o porquê disso, nem sei para quem isso possa interessar, mas pra mim é um exercício interessante. Afinal, não é todo dia que se bebe vinho caro a um preço módico e,parte-se, em menos de um mês, pra uma cachaça barata a um preço exorbitante! Passei um bom tempo justificando o meu total desleixo para com este diário de viagem à necessidade de publicá-lo na internet. Eu precisava criar um blog e criar um blog decente exige elaborar a boneca, a estrutura desse formato. Só assim todo este esforço faria sentido. Todavia, nunca parei para pensar no formato desse blog. A única ideia que me vinha era que o mote seria mostrar como eu fui esperta e marota na organização dessa viagem, porque comprei dinheiro com ótimas taxas de câmbio e lucrei com isso, me hospedei em albergues bons e baratos, fiz todo o roteiro turístico que um gringo deve fazer, andei de táxi e comi massas e queijos franceses todos os dias. O negócio é puxar a mala de rodinha sem descer do louboutin falsiê.Tudo bem, sempre há atropelos, como no albergue em que fiquei em Buenos Aires. Lá, além de um casal de travestis, havia uns jovens com um visual grunge que se locomoviam sobre skates pelas largas avenidas de BsAs e um australiano com cara de pevertido sexual. Mas abrir-se para a diversidade, à diferença e ao cosmopolitismo de uma grande cidade só fazem bem à pele. Inlusive,fiz amizade com Florencia e Violeta durante o café-da-manhã, sempre sentávamos juntas. Descobri até um gosto cinematográfico em comum: nós adoramos as séries produzidas por Buck Angel, uma transgênero mulher para homem, como dizem os americanos. Somos fãs de Buck Back Mountain, a paródia pornô do clássico de Ang Lee, com Buck Angel defendendo a personagem que imortalizou Heath Ledger. E para selar tal encontro, decidi jogar uma partida de sinuca com uma das moças de calcinha estufada. A partida fez mais sucesso do que Argentina x Paraguai, que estavam disputando uma vaga para a Copa do Mundo de 2010 naquele instante, televisionado para todo o país. Grande duelo de "pool" entre Brasil e Argentina anuciavam os funcionários e hóspedes do hostel. Florencia, a minha rival, encaçapou mais bolinhas que eu. Os garotos grunges do Chile disseram que ela tinha mais prática na arte de meter bolas pra dentro.Isso amenizou muito a minha raiva, porque eu detesto perder, ainda mais pra argentinos! Mas voltando ao assunto,porque devaneios são legais, mas têm limite! Esses dias uma amiga me ligou e perguntou das viagens. Neste instante me toquei que não havia revelado uma única foto do roteiro Argentina-Uruguai-Sampa-Ouro Preto e adjacências-Sampa. Estavam todas no HD do meu laptop, correndo o sério risco de serem devoradas por um cavalo-de-tróia selvagem. Eu disse que queria vê-la, pra poder contar da aventura toda,já que ela só sabia da etapa castelhana da viagem. Adiantei que tinha feito o circuito das águas e das cidades hsitóricas no sul de Minas e que havia estado em Sampa antes de voltar pra casa. Queria contar do pão-de-queijo soberbo que comia de manhã, de tarde e de noite, da outra língua falada em Minas (porque aquilo não é português nem aqui nem em Macau!), do baconzito´s vendido na carrocinha de pipoca, do ponto turístico mais divertido de são paulo (os engarrafamentos da Dutra), das minhas andanças na Av. 25 de março, sobre a esquina da Ypiranga com a São João, sobre os japonesinhos da Liberdade e do sonho que é ter um metrô para chamar de seu. Ainda ao telefone, essa amiga me disse que acha que lugar que não tem praia é sempre meio sem graça. Segundo ela, mesmo que a gente não goste de praia, é bom tê-la por perto, nem que seja só pra compor a paisagem. Fiquei pensando nisso... e pela primeira vez resolvi meditar sobre a viagem, escrever os primeiros garatujos que integrarão o blog. Pensei que eu até simpatizo com cidades que não têm praia, como BsAs, por exemplo. O problema é que o sul de Minas é místico e eu não tenho mais idade para riponguices. E sampa não tem charme. A arquitetura é moderna demais.Falta um certo glamour vintage,sabe como é?Ou até mesmo arrojo futurista. A cidade é a cara dos anos 70 e anos 70 me lembram a crise do petróleo,ombreira,saída de banho verde cana, neoliberalismo, tanga asa-delta,permanente no cabelo,guerra fria, camisa bouclê, ditadura militar e franja cacheada. E esse é um tempo que preferiria não ter vivido...